sexta-feira, 28 de novembro de 2008

O 25 de Abril foi "a auto-derrota de uma Nação"

In "Expresso ":

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Rui Patrício (à direita), antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, ao lado do embaixador José Manuel Villas-Boas.

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Marcelo Caetano afirmou que, em 1974, "a situação, interna e externa, estava longe de ser alarmante". Rui Patrício, que vive no Brasil desde o 25 de Abril, sublinhou que nessa altura "o problema essencial não era de política externa, mas de ordem interna". Quanto à descolonização que se seguiu, foi "uma auto-derrota de uma Nação".

Rui Patrício falava num colóquio sobre a diplomacia portuguesa, o quinto do ciclo 'Tempos de Transição. 1968-1974', sobre o marcelismo, e que teve lugar na quarta-feira, 19.

Rui Patrício, que não reconheceu qualquer erro na governação de Caetano, insistiu na tecla das "características específicas da política ultramarina portuguesa", que "não eram tidas em conta" nos areópagos internacionais. Criticou especialmente "o movimento comunista internacional", em que incluiu indistintamente a União Soviética e a China. Quanto à ONU, acusou-a de ter sido "o grande palco da campanha política e mediática contra a presença de Portugal em África".

Neste contexto, disse Rui Patrício, "a tarefa da diplomacia portuguesa era árdua, difícil e diária". Mas, na opinião do ex-ministro, "tínhamos a razão, o consenso, o direito e a equidade".

África fazia parte da "nação portuguesa"

Ao longo de uma hora, Patrício expôs os principais episódios que marcaram a diplomacia portuguesa durante os seis anos do consulado de Caetano. Elogiou Jorge Jardim e referiu-se de passagem aos "contactos que Senghor quis ter com o general Spínola" - que não deixou de criticar, "por ter participado no derrube do regime".

Justificou a invasão da Guiné-Conacry, conhecida por 'Operação Mar Verde', e negou que tenha havido um "ultimato americano" para a utilização da base das Lajes aquando da guerra israelo-árabe. Quanto à Grã-Bretanha, assinalou o "degelo" que então se verificou, traduzida, entre outras iniciativas, na agitada visita de Caetano a Londres.

Rui Patrício rejeitou as críticas sobre "pretensas hesitações e flutuações" da política externa de que foi o principal rosto. Pelo contrário, acentuou, ela foi caracterizada por "uma coerência absoluta e total". E deteve-se, longamente, na justificação da recusa em manter "conversas ou negociações com os chamados movimentos de libertação". Operavam, afinal, em "territórios que constituíam a nação portuguesa".

Embaixador Villas-Boas: "Decisões ad-hoc e precipitadas"

Opiniões bem diferentes foram expressas pelo embaixador José Manuel Villas-Boas. Quando Caetano ascendeu ao poder, em 1968, o país estava, no plano externo, numa posição "desastrada". Pedindo autorização para falar em nome dos diplomatas, disse que, para estes, "a palavra esperança renasceu durante" a primavera marcelista. "Marcelo Caetano sabia que era necessário introduzir reformas na política externa".

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Pormenor da assistência, onde se destacam em primeiro plano André Gonçalves Pereira, Maria João Avilez e Manuel Braga da Cruz.

À época cônsul de Portugal em Milão, mas com acesso directo a Caetano, de quem fora aluno, Villas-Boas afirmou que "a diplomacia do período de transição foi caracterizada por um certo sentimento de angústia", provocado até pela consciência de que "o tempo era curto". Do que resultou "uma aparência de hesitação".

Em 1974, porém, "as coisas corriam já mal. Pelo que as decisões de política externa eram tomadas, às vezes, de forma ad-hoc e quase precipitada". Nesse ano, "a amargura do Presidente do Conselho era evidente".

Comentando o livro 'Portugal e o Futuro', frisou que as teses de Spínola, no sentido do "federalismo", não eram muito diferentes das de Caetano. Este sabia que "a guerra de África não levava a lado nenhum" e que "a única solução era política". No entender do embaixador, "a autonomia progressiva e participada", delineada por Caetano, "era o caminho para as independências".

Negociar com o PAIGC o cessar-fogo e a independência

Villas-Boas contou que Caetano o enviou, como "emissário pessoal", à Costa do Marfim e à República Centro-Africana, para explicar "os detalhes da nova política africana" - um projecto que, de início, também incluía o Senegal. E relatou com pormenor a negociação com o PAIGC, em Março de 1974, em Londres, em que foi emissário do governo português.

"Era necessário obter o cessar-fogo na Guiné"", justificou, ao mesmo tempo que assegurou que o governo o instruíra para "falar de todos os assuntos, incluindo a independência política" da Guiné.

Confrontado por perguntas da assistência, Rui Patrício reafirmou: "Estávamos no caminho certo". Quanto às negociações com o PAIGC, justificou-as com a necessidade que há, em diplomacia, de "ter sempre um plano B".

O embaixador Luís Figueira deteve-se na exposição da diplomacia económica, matéria em que Caetano "apoiou completamente a política anterior".

O colóquio decorreu, como de costume, no anfiteatro da Escola de Belas Artes, em Lisboa. A próxima sessão, a 11 de Dezembro, terá como tema a revisão constitucional de 1973 e está anunciada a participação de Jorge Miranda e Miguel Galvão Teles.

Ver: Veiga Simão demitiu-se três vezes

Marcelo Caetano demitiu-se por três vezes

Portugal viveu "anos dourados"

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Cahora Bassa um ano depois da sua venda a Moçambique

In "Expresso":

O Songo, vila do distrito de Tete em Moçambique onde se encontra sedeada a Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), acordou de madrugada para as comemorações do primeiro aniversário da reversão da Barragem para o Estado moçambicano.

Um carregado programa de festejos com diversas inaugurações e o tradicional comício com representantes dos governos central e provincial e altos quadros da Frelimo marcou os festejos.

A inauguração de um sistema de painéis solares, patrocinado pela HCB, na pequena e isolada aldeia de Cabulvacie a cerca de 30 km da Barragem de Cahora Bassa permitiu levar a elctricidade a cerca de 200 pessoas.

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Barragem de Cahora-Bassa - A Entrega - SIC - 27-11-2007:

 

Barragem de Cahora-Bassa - A Entrega - TVI - 27-11-2007:

Ver:   Barragem de Cahora Bassa

CAHORA BASSA - Antes e depois de 1975:

Como é do conhecimento geral a FRELIMO, durante a denominada "luta de libertação nacional" tudo fez para evitar a construção da Barragem de Cahora-Bassa, a quinta maior do mundo, obra que deveria ser orgulho dos portugueses, não só quanto à sua dimensão, como às circunstâncias que rodearam a sua construção.

Hoje, Cahora Bassa produz e transporta electricidade para  Moçambique, República da África do Sul, Zimbabué, Botsuana e, em breve, para o Malwi.

Na sua albufeira, com 270 km de comprimento e até 30 km de largura, são pescadas, diariamente,  toneladas de peixe.

Mais tarde, em 1986, em visita ao local, é descerrada por Samora Machel a placa cuja imagem apresentamos:

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A inscrição:

"Esta maravilhora obra humana do género humano constitui um verdadeiro hino à inteligência, um promotor do progresso, um orgulho para os empreiteiros, construtores e trabalhadores desta fantástica realização.

Cahora Bassa é a matriz do desenvolvimento do Moçambique independente. Os trabalhadores moçambicanos e portugueses, fratrenalmente, juntando o suor do seu trabalho e dedicação, garantem que este empreendimento sirva os interesses mais altos do desenvolvimento e prosperidade da R.P.M.

Moçambicanos e Portugueses consolidam aqui a unidade, a amizade e solidariedade cimentadas pelo aço e betão armado que produziu Cahora Bassa.

Que Cahora Bassa seja o símbolo do progresso, do entendimento entre os povos e da paz no mundo."

Samora Machel - Songo 17 de Setembro de 1986

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O último construtor do Império

Actualização em 30-11-2008:

In "EXPRESSO Assinantes":    A barragem do consenso:

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TRANSFERÊNCIA
Cahora Bassa entra para a Parpública

O Governo português pediu autorização ao Estado moçambicano para transferir os 15% que detém no capital da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB). Esta possibilidade estava prevista no âmbito do acordo assinado em 2007 entre os dois países e que permitiu a reversão da barragem de Cahora Bassa para o Estado moçambicano há um ano, desde que fosse uma empresa portuguesa de capitais exclusivamente públicos. O Governo português manifestou já essa intenção ao Executivo de Maputo e foi iniciada a reavaliação em valores de mercado do valor da participação portuguesa na HCB, confirmou o ministro moçambicano da Energia, Salvador Namburete. Nos termos do acordo assinado a 27 de Novembro de 2007, Portugal recebeu 950 milhões de dólares de indemnização do investimento feito na barragem, bem como dos seus juros. Confrontado pelo Expresso, o administrador-executivo Fernando Marques da Costa não quis fazer qualquer comentário sobre a transferência da participação do Tesouro para a holding Parpública.

RECONSTRUÇÃO
Novecentas torres destruídas

Novecentas torres de distribuição de energia ao longo de 1500 quilómetros foram destruídas entre 1984 e 1996 pela guerrilha anti-Frelimo, de acordo com os dados fornecidos pelo ministro da Energia, Salvador Namburete. O responsável avalia em cerca de 130 milhões de dólares o investimento feito na reconstrução das torres e na reabilitação das linhas de transporte de energia. “A HCB nunca foi nacionalizada por ser central para o desenvolvimento do país”, afirmou Salvador Namburete. A infra-estrutura da barragem e central de geração e as linhas são propriedade do Estado moçambicano desde a independência, em 25 de Junho de 1975. “Mas o serviço de geração, transmissão e distribuição de energia tinha sido concessionado a uma empresa privada, a HCB. Uma sociedade que precisava de vender energia para reembolsar os empréstimos feitos para a construção”, salientou o ministro. Salvador Namburete relembra que “mesmo durante a ocupação colonial e a construção da barragem o Presidente Samora Machel nunca quis que a guerrilha da Frelimo atacasse Cahora Bassa”. Samora Machel tinha a noção clara de que a barragem era vital para o desenvolvimento futuro do país. Isto “contra outros partidários, que consideravam que a construção da barragem iria dificultar a travessia do rio Zambeze ao movimento de libertação”.

PONTOS FORTES

800 mil dólares por dia é o valor da electricidade gerada em Cahora Bassa

Cinco turbinas para uma potência de 2075 MW

300 milhões de dólares de receitas por ano

A barragem de Cahora Bassa, no rio Zambeze, é a maior obra de engenharia portuguesa fora de Portugal e o segundo maior aproveitamento hidroeléctrico do continente africano, depois de Assuão

A construção começou em 1969, no âmbito do Plano do Vale do Zambeze

Com 250 quilómetros de extensão e 38 de largura, a albufeira começou a encher em Dezembro de 1974, seis meses antes de Moçambique declarar a independência

Angola 1972-1974

In "ANGOLA DO OUTRO LADO DO TEMPO...":

Em 1972 -1974 Angola era uma Nação próspera praticamente auto-suficiente em tudo. Tínhamos bons quadros técnicos, serviços de saúde pública e privada, indústrias, agricultura, pescas, minérios, petróleo e diamantes enfim tudo o que uma grande nação poderia ambicionar.

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Um sorriso inocente
(foto Net)

Podia-se viajar sem problemas porque a tropa que estava em Angola era mais que suficiente para manter afastados os tais libertadores a soldo das grandes potências e, a prova disso, são as fotografias que podereis ver das minhas viagens ao interior de Angola com a minha família. A viagem que tinha projectado fazer nas próximas férias antes do 25 de Abril seria: Luanda, N'dalatando, Malange, Saurimo, Moxico, Kuito, Huambo, Namíbia, Benguela, Lobito e voltar a Luanda. Infelizmente não passou de um sonho poder voltar a visitar algumas das principais cidades e a beleza da terra que amava e a quem dei os melhores anos da minha vida.

Já não era tão fácil enviar para o exterior o capital das empresas porque havia controle, por isso, havia cada vez mais investimento e a consequente exportação. Havia escolas para todos sem excepção desde o ensino básico até à universidade. Nas repartições públicas os funcionários angolanos pretos e mestiços eram em bem maior número que os brancos. Como em todas as cidades havia os bairros periféricos chamados musseques onde habitavam inclusivamente brancos da classe mais humilde e algumas construções de vários andares como no Prenda onde eu tinha comprado um andar num desses prédios que vedes na fotografia.

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Musseque Prenda- Luanda (foto Era Uma vez...Angola, Paulo Salvador)

Alguns comerciantes instalaram-se nesses musseques para maior facilidade de comercialização dos seus produtos junto dos moradores. Foram esses os primeiros a sofrer as represálias e até a morte pelos camaradas assassinos do MPLA. As principais cidades de Angola como Lobito, Benguela, Huambo, Kuito, Lubango, Uige, etc, tinham praticamente o mesmo desenvolvimento de Luanda embora esta fosse a capital. Havia praticamente emprego para todos mesmo para os menos instruídos. No interior de Angola nas povoações mesmo nas mais afastadas cultivavam-se as lavras em paz e colhiam o suficiente para o seu sustento e ainda para trocar ou vender no comerciante mais próximo adquirindo o que necessitavam. Infelizmente, actualmente não o podem fazer porque existem cerca de 18 milhões de minas anti-pessoais espalhadas por todo o lado que fazem milhares de estropeados, segundo estimativas cerca de 30.000.

Existia já uma classe média e média alta de angolanos de todas origens. Poderia dizer-se que Angola era um país rico e se nessa altura lhe fosse dada a independência, tal como foi dada à África do Sul, hoje Angola seria uma das nações mais ricas da costa ocidental de África. Por isso era cobiçada pelas suas riquezas tanto pelos americanos como pelos russos e outros mais.

"Confrontado com 13 anos de guerra colonial e com pressões do Presidente da República, Américo Tomás, Marcello Caetano que sucedera a Salazar, encorajou várias abordagens aos movimentos de libertação ou alguns dos seus dirigente, nos meses que antecederam a revolução. Aparentemente para fazer sair o país do impasse. Exemplo disso era a visita que planeava fazer a Angola no final de Abril de 1974. Dois meses depois de uma longa conversa com o governador geral."

DN, sexta-feira 27/05/2005. Temas do Dia, Bastidores da Política Ultramarina. Marcelllo Caetano admitiu Angola Independente.

Entretanto aconteceu o 25 de Abril e as intenções de Marcello Caetano infelizmente para o povo Angola e para nós, não se chegaram a concretizar.

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Marcello tinha planos para a independência de Angola para 1974 (foto DN 27/05/2005)

AS REFORMAS ESTILHAÇAM-SE PERANTE O PROBLEMA COLONIAL

"Com o objectivo de consolidar-se no poder e ampliar a sua base de apoio, Caetano aproveitou as eleições de Outubro de 1969 para consultar a população acerca do problema crucial que o regime enfrentava: a questão colonial. Estas eleições foram realizadas com o propósito de garantir-lhe os apoios necessários: tanto a nível interno, reforçando a sua imagem perante os seus pares da ditadura e legitimando a sua autoridade diante da oposição democrática; e, no âmbito internacional, desanuviando o clima de hostilidade a Portugal, país que cada vez mais sofria críticas em todos os fóruns internacionais. Marcelo Caetano sabia que não iria perder as eleições. O seu prestígio pessoal e, sobretudo, a manipulação do escrutínio garantiam a vitória.
Mas, numa perspectiva história, pode dizer-se que as eleições de 1969 foram um fracasso para Marcelo Caetano. Pois, apesar de muitos dos integrantes das listas da União Nacional serem gente nova, ele teve de integrar nelas declarados inimigos seus que, vinte dias depois de inaugurada a legislatura, provocaram uma votação na Assembleia Nacional a favor da política ultramarina iniciada por Salazar.
Os limites do poder de Marcelo Caetano ficaram claros quando teve de enfrentar a ala mais ortodoxa da ditadura, especialmente por causa das divergências sobre o Ultramar. Para Caetano (assim o disse em Setembro de 1970), a permanência em África justificava-se por causa dos portugueses lá instalados e para fazer face aos compromissos internacionais contraídos pelo Governo. Ainda assim, atreveu-se a assinalar que a independência das colónias não significava a perda da nacionalidade, ideia que os ultras do regime consideravam um sacrilégio, já que, para eles, Portugal, sem as colónias, seria devorado pela Espanha. Nesse contexto, em Dezembro de 1970, o presidente do Governo apresentou na Assembleia Nacional um anteprojecto de Revisão Constitucional, com a intenção de encontrar uma via intermédia entre os deputados liberais e os de extrema-direita e realizar as reformas que considerava necessárias. Deste modo, as modificações que Marcelo Caetano introduziu na Constituição de 1933 diziam respeito à estrutura do Estado. Portugal continuava a ser um país unitário, mas passava a ter regiões autónomas com poderes próprios. O resultado da Revisão Constitucional foi discreto e teve a virtude de não agradar nem à direita nem à esquerda".
http://historiaeciencia.weblog.com.pt/arquivo/041708.html

25 de Abril de 1974

"Aos 25 minutos do dia 25 de Abril, a canção de Zeca Afonso era o sinal para o início do movimento revolucionário militar que poria fim à ditadura. A voz do cantor contestatário significava, para quem sabia, que chegara ao "ponto de não regresso" de uma revolução montada em todos os pormenores. Da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, saíram pouco depois efectivos militares, com destino a Lisboa: dois esquadrões, um auto transportado outro de reconhecimento. A coluna sob o comando do capitão Salgueiro Maia, saiu pelo portão da Parada Chaimite, em frente do Jardim da República.

Os oficiais que permaneceram na unidade, liderados pelo major Costa Ferreira, 38 anos, seis comissões de serviço em África, começaram a tomar as disposições necessárias ao que viria a constituir a retaguarda do movimento. A revolta na Escola Prática de Cavalaria iniciara-se, de facto às 21.30 quando o 2º Comandante da unidade, tenente-coronel Sousa Sanches, posto ao corrente de revolução, recusou participar e foi "desactivado"sem grandes problemas. O coronel Augusto da Fonseca Laje, comandante da E.P.C., ausentara-se para Lisboa, por motivos pessoais.

O major Costa Ferreira, em entrevista ao "Diário de Notícias" revelou que o Movimento das Forças Armadas começou a gizar-se em Setembro. Os contactos entre os oficiais revelaram-se extremamente difíceis, sendo necessário recorrer a vários estratagemas. O movimento esteve para concretizar-se a quando da revolta das Caldas da Rainha "e a Escola prática de Cavalaria de Santarém não colaborou apenas por terem surgido dificuldades de ocasião". "No entanto não estava posta de parte a possibilidade do movimento do movimento vir a concretizar-se. Apenas se pretendia encontrar o momento oportuno para isso" – disse, ao redactor do Diário de Notícias, aquele oficial.

O primeiro sinal, "segundo o que estava idealizado" deu-o o locutor dos Emissores Associados de Lisboa, ao anunciar "Faltam 5 minutos para as 23 horas, seguindo-se a canção "E depois do Adeus", interpretada por Paulo de Carvalho. Quando a Rádio Renascença transmitiu a canção de Zeca Afonso, tanto a escola Prática de Cavalaria como em 29 outras unidades militares que apoiavam o Movimento, em toda a Metrópole, se desencadeou a revolução. Os dados estavam lançados.

Em Santarém, patrulhas militares tomaram conta dos pontos estratégicos. O Comandante Militar da cidade, coronel Hugo Leitão, "inteirado do que se passava não opôs quaisquer dificuldades". A população aderiu, de imediato, ao levantamento".

EM LISBOA E NO PORTO A POPULAÇÃO VITORIOU
AS FORÇAS ARMADAS.

"Às quatro da madrugada, o movimento das Forças Armadas dominavam, em Lisboa, os principais órgãos de Poder, enquanto recebia adesões de Norte a Sul da Metrópole. A primeira notícia de revolução foi dada pelo Rádio Clube Português, em poder dos sublevados, que se apoderaram também da Emissora Nacional. Esta transmite contínuos apelos à população para que não saísse à rua e pedia à GNR e à PSP que se rendessem, para evitar o derramamento de sangue. Numa operação perfeitamente sincronizada, grupos militares cercaram os edifícios governamentais, no centro de Lisboa, praticamente dominada quando amanheceu. Militares distribuíam panfletos em que anunciava a finalidade da revolta e as razões desta. A Emissora Nacional recomeçou a funcionar, pouco tempo depois das 8 horas transmitindo o mesmo comunicando que, de 15 em 15 minutos, era difundido pelo Rádio Clube Português, tocando a seguir o Hino Nacional.

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25 de Abril de 1974 (foto DN 3/8/2005)

Forças da Escola Prática de Cavalaria, da Escola Prática de Infantaria (Mafra), do Regimento de Engenharia 1 (Lamego) e do Batalhão de Caçadores 5 dominavam a baixa Lisboeta, enquanto forças de Vendas Novas tomam posições do outro lado do Tejo, em Cristo Rei. Unidades da Marinha de Guerra, que aderiu, desde o princípio, na sua quase totalidade, à revolução, evolucionaram frente ao Restelo.

O total das forças que ocuparam o Terreiro do Paço, o Rossio, a Praça do Comércio e outros pontos estratégicos da Baixa cifraram-se em cerca de 600 homens e 50 autometralhadoras e carros de combate. A população lisboeta aderiu, de imediato à revolução por vezes complicando os movimentos das tropas, que seguiam por toda a parte.

Cerca das 11 horas, saíram do Terreiro do Paço três colunas militares com objectivos específicos. Uma de fuzileiros da Armada dirigindo-se para as instalações da DGS; outra tomou por objectivo o quartel da Legião Portuguesa e a terceira o quartel da Guarda Republicana, ao Carmo. Ali se tinham refugiado o Almirante Américo Thomaz, o Sr. Prof. Marcello Caetano e vários membros do Governo. Helicópteros da Força Aérea, sobrevoam o Quartel".

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25 de Abril de 1974 (foto Notícia. Angola)

"Às 11.40, o Movimento das Forças Armadas afirma, num comunicado, que "domina a situação de Norte a Sul e dentro em pouco chegará a hora da liberdade". O povo de Lisboa, com evidência para a juventude, apesar dos apelos para que não saia de casa, reúne-se até formar multidão no Rossio e na Praça do Comércio, vitoriando as Forças Armadas. Oferecem cigarros, sanduíches e flores aos militares.

Logo no início da rebelião, os aeroportos de Lisboa, Porto e Faro foram encerrados ao tráfego. Ao amanhecer, os barcos estrangeiros surtos no Tejo receberam ordens para levantarem ferro. A fronteira com a Espanha está, também encerrada.

Às 14 horas o movimento militar está praticamente vitorioso em toda a Metrópole. O General Costa Gomes assume a chefia da 2ª Região Militar (Porto), sem encontrar, praticamente, oposição. Em Viseu, o Regimento de Infantaria 14 anuncia a sua adesão à revolta e sai do quartel, para se juntar a outras unidades militares, também sublevadas, que avançam para Sul. Em Coimbra não se vislumbra movimento de tropas.

Apenas, quase por toda a parte, se levantam dois pólos de resistência: a Guarda Nacional Republicana e a DGS., que várias vezes salvaram de "apertos" os regimes de Salazar e de Marcelo Caetano. Da parte do Exército houve um sinal de resistência inicial à sublevação quando o comandante de uma unidade constituída por cinco carros de combate, que tomara posições perto do Rossio, ordenou fogo contra as tropas sublevadas. Não foi obedecido.

Até à 16 horas, o Movimento das Forças Armadas consolida as suas posições. Oficiais da Escola Prática de Cavalaria ocupam o Ministério da Defesa, dominando todo o edifício sem oposição todo o edifício. São presos então os Chefes de Gabinete do Ministro do Exército, General Luz Cunha e do Secretário de Estado da mesma pasta, além de outros oficiais que se mantinham fieis ao regime de Marcello Caetano. O Ministro da Defesa, do Exército, das Corporações e do Interior, que dali tentavam fazer face à revolução, ao verem perdida a esperança de um "volte-face" escaparam por um buraco aberto numa parede.(...).

Os 180 agentes da DGS presos no dia anterior nas instalações da Rua António Maria Cardoso seguiram às 0.45 da madrugada para a prisão de Caxias onde ficaram internados".

In "Notícia", O Jornal de João Charula de Azecedo, Nr.752-Luanda.

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25 de Abril de 1974 (foto DN 4/8/2005)
Diário de Notícias, 4 de Agosto de 2005. 1975 - Verão Quente. O Estado transformou-se no maior conglomerado da Europa ocidental, com grandes, média e pequenas empresas espalhadas pelo País. Para os historiadores, as nacionalizações são a continuidade do peso do Estado na economia herdada da ditadura. Para outros, tratou-se de corte no dinamismo de certos grupos empresariais cujas consequências o País, ainda hoje, está a pagar.

O Estado nacionalizou um terço da economia.

Luis Miguel Viana.

Em 1975, de um momento para o outro, o Estado português viu-se proprietário de 1300 empresas empresas. De alguns potentados industriais, certamente, de empresas de sectores estratégicos para qualquer economia. Mas também de barbearias na baixa de Lisboa, de restaurantes nas maiores cidades, de alguns hotéis, de modestas fábricas de transformação de tomate e de um cortejo muito pitoresco de pequenas e médias empresas espalhadas pelo País vieram ao arrasto da nacionalização dos grandes grupos. Estes, muito dentro do espírito da época, tinham tentado diversificar o mais possível a sua actividade, penetrando em sectores completamente diversos no negócio de origem.

A seguir ao Verão Quente quando terminou o Processo Revolucionário em curso (Prec), o Estado Português tinha-se transformado no maior conglomerado da Europa, no maior grupo empresarial fora dos países de economia planificada. Falou-se num peso de 30% do PIB nacional, cálculos mais recentes apontam para um VAB das empresas públicas sobre o PIB de 19,8% em 1976, contra 24,7% da Itália e 12,0% da França - embora nestes países o Estado não detivesse monopólios de sectores vitais, como a banca. (...) TRADIÇÃO ESTATISTA. Em 1975, no 11 de Março, quando se derrotou o alegado golpe golpe dos spinolistas que permitiu ao PCP empurrar o Governo de Vasco Gonçalves e o Movimento da Forças Armadas (MFA) para a estatização de empresas, Portugal não era uma economia liberal. Pelo contrário: apesar da sua matriz predominantes privada, organizara-se num modelo fortemente condicionado pelo Estado, quer como cliente, quer como regulador, quer, sobretudo, como protector das pressões da concorrência externa.(...)

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Documento redigido pelos oficiais moderados do MFA,
com Melo Antunes à frente, apressou a sua queda (foto DN 7/8/2005)

Diário de Notícias, 7 de Agosto de 2005. 1975 - Verão Quente. A 7 de Agosto, há exactamente 30 anos, um grupo de oficiais pertencentes ao Conselho da Revolução entregava ao Presidente da República e fazia distribuir pelo País um documento que denunciava a extrema-esquerda política e militar, abrindo ainda mais fracturas no Movimento da Forças Armadas. Foi um marco decisivo para travar a influência comunista em Portugal. "Segundo justificou Vasco Lourenço, o Documento dos Nove foi um "grito de revolta" destinado a separar o Movimento das Forças Armadas da estratégia comunista".

Documento dos Nove. O diagnóstico de Melo Antunes. ESTADO."Verifica-se a progressiva decomposição das estruturas do Estado. Formas selvagens e anarquizantes de exercício do poder fora-se instalando um pouco por um toda a parte (até no interior das Forças Armadas)." MFA. "O Movimento das Forças Armadas, que inicialmente se havia afirmado como suprapartidário, viu-se cada vez mais enleado nas manipulações políticas de politiqueiras de partidos e organizações de massas, acabando por se ver comprometido com determinado projecto político (do PCP)."

ENONOMIA. "Aproxima-se o momento mais agudo duma crise económica gravíssima, cujas consequências não deixarão de se fazer sentir ao nível duma ruptura, já inicialmente, entre o MFA e a maioria do povo português." DESCOLONIZAÇÃO. " A fase mais aguda da descolonização (Angola) chega sem que se tenha tomado em consideração que não era possível "descolonizar", garantindo uma efectiva transição pacífica para uma verdadeira independência, sem uma sólida coesão do poder político."

COMUNICAÇÃO SOCIAL. "Larga parte dos meios de comunição social (sofre) de um rígido controlo partidário que sobre eles se exerce - particularmente nos nacionalizados -, assistindo-se hoje ao degradante espectáculo da corrida de uma boa parte da população aos noticiários de emissoras estrangeiras sobre o nosso País." SOCIALISMO. "É necessário denunciar vigorosamente o espírito fascista subjacente ao projecto que, dizendo-se socialista, acabará numa ditadura burocrática."

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Último governo de Vasco durou menos de um mês. (foto DN 8/8/2005).

"DN 8/8/2005. 1975 Verão Quente. Logo no momento da posse, o presidente Costa Gomes anunciou ao País que seria um Governo de "passagem". Esta previsão, que deixou estupefacto o primeiro-ministo Vasco Gonçalves, confirmou-se por inteiro: antes do fim do mês, era anunciada a demissão do Executivo. Foi um dos governos mais breves de que há memória em Portugal. E também um dos mais polémicos.

Pedro Correia.

Havia dúvidas? Deixou de haver. No próprio discurso da posse, o presidente da República deixou claro que aquele era um Governo "de passagem". O primeiro-ministro Vasco Gonçalves, que não fora informado desta intervenção do general Costa Gomes, ficou perplexo. E o País testemunhou em directo essa perplexidade através das imagens da RTP. Era a investidura do V Governo Provisório - o último em que o PCP teve uma influência determinante. Faz agora 30 anos.

Este controverso Governo foi de imediato considerado "um nado morto". Por personalidades tão diversas como o lider do PS, Mário Soares, o major Melo Antunes (que liderava a ala moderada das forças armadas) e o secretário-geral do MRPP, Arnaldo Matos. Portugal estava sem executivo desde que os socialistas abandonaram a coligação governamental a 10 de Julho. Seis dias mais tarde, com a saída do PPD, o IV Governo Provisório chegou ao fim. Seguiram-se três semanas de imensas negociações para formação de um novo elenco ministerial. Vasco Gonçalves, que chefiara três Executivos desde Julho de 1974, estava politicamente ferido de morte. Mas recusava sair de cena.

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Otelo com Rosa Coutinho (foto DN, 8/8/2005)

Socialistas e sociais-democratas desciam diariamente à rua, reclamando um Executivo que reflectisse os resultados eleitorais (no escrutínio para a Assembleia Constituinte, a 25 de Abril, o PS fora a força mais votada, com 38%, seguindo-se o PPD, com 26%). Na cimeira de Helsínquia, em Julho, Costa Gomes escutara severas palavras de líderes europeus contra um regime socialista decalcado do Bloco de Leste. E na véspera da posse do V Governo, nove oficiais que integravam o Conselho da Revolução tinham divulgado um comunicado que denunciava a contínua erosão do poder político e a quebra do tecido social português. (...)"

SAÍDA DE MARCELLO CAETANO

"Marcelo Caetano foi induzido pelos próprios sistemas de segurança a dirigir-se para o Quartel do Carmo, que se transformou no ponto central das operações militares. Ao princípio da tarde, Salgueiro Maia, comandante dos revoltosos no local, dispôs as forças em posição de cerco e preparou-se para a queda do último símbolo do regime. O povo de Lisboa, figurante activo e cada vez mais interveniente, respondia com crescente entusiasmo ao teor dos comunicados transmitidos e aos objectivos políticos do MFA. Do posto do comando, instalado no quartel do Regimento de Engenharia 1, na Pontinha, o MFA procurou conduzir a acção militar e pôr fim à expectativa.

Entretanto, no próprio Quartel do Carmo, efectuou-se um contacto entre o general Spínola e Marcelo Caetano, ficando deste encontro a expressão deste último ao afirmar que preferia entregar o poder a alguém que lhe desse garantias, em vez de deixar que caísse na rua. De certa forma, formalizou-se neste cenário a queda do governo, com a prisão de Marcelo Caetano e de alguns Ministros.

Ao princípio da noite, o MFA divulgou a sua proclamação, primeiro documento programático preparado antecipadamente e que continha as intenções fundamentais do movimento militar: entrega do Governo a uma Junta de Salvação Nacional, próxima difusão de um programa do MFA, restituição ao povo português das liberdades cívicas e eleição de uma Assembleia Nacional Constituinte".

http://jn2.sapo.pt/secdiv/especial/angola1.htm

MARCELLO CAETANO ENTREGOU A SUA RESIGNAÇÂO AO CAIR DA NOITE

"O Movimento da Forças Armadas emitiu às 20 horas o seguinte comunicado: "O Movimento das Forças Armadas informa que se concretizou a queda do Governo, tenho sua excelência o Prof. Marcello Caetano apresentado a sua rendição incondicional a sua excelência o general António Spínola.

O ex-presidente do Conselho, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e o ex-ministro do Interior encontram-se sob custódia do Movimento, enquanto sua excelência o almirante Américo Thomaz e alguns ex-ministros do Governo se encontram refugiados em dois aquartelamentos que estão cercados pelas nossas tropas e cuja rendição se aguarda para breve.

O Movimento das Forças Armadas agradece a toda a população o civismo e a colaboração demonstrados, de maneira inequívoca, desde o início dos acontecimentos, prova evidente de que ele era o intérprete do pensamento e dos anseios nacionais. Continua a recomendar-se a maior calma e a estreita obediência a todas as indicações que forem transmitidas. Espera-se que amanhã a vida possa retomar o seu ritmo normal por forma a que todos, em perfeita união, consigamos constituir um futuro melhor para o País. Viva Portugal".

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General Spínola, proclamação da Junta de Salvação Nacional.
( foto Prov. Angola 26/04/1974)

PROCLAMAÇÃO DA JUNTA DE SALVAÇÃO NACIONAL

"Spínola proclamado Chefe da Nação Portuguesa e Presidente da Junta de Salvação Nacional. É a seguinte a constituição da Junta de Salvação Nacional: general António de Spínola, que preside à Junta; general Costa Gomes; brigadeiro Jaime Silvério Marques; coronel Carlos Galvão de Melo; general Manuel Diogo Neto, ausente da Metrópole; capitão de mar-e-guerra José Baptista Pinheiro de Azevedo e capitão-de-fragata António Alva Rosa Coutinho".

A formação da Junta de Salvação Nacional

Fora inicialmente acordada uma formação em que interviriam seis elementos, um de cada ramo das Forças Armadas. Contudo surgiu a necessidade de integrar um sétimo membro, pois a um deles estaria reservado o cargo de Presidente da JSN acumulando com a função de Presidente da República a título provisório. Tal desempenho estaria reservado a Costa Gomes, cabendo a Spínola a chefia do Estado-maior das Forças Armadas.

A princípio só generais integrariam a Junta por questões de hierarquia. Era fundamental que todos possuíssem estrelas nos ombros para, desde logo, se situarem em plano de igualdade com Spínola não permitindo que a ditadura militar vingasse pela mão deste general.

Spínola não aceitava a participação de qualquer general que tivesse feito parte da Brigada do Reumático. O sétimo elemento escolhido acabou por ser Jaime Silvério Marques. A par deste compunham a Junta Militar: Spínola e Costa Gomes do Exército, Pinheiro de Azevedo e Rosa Coutinho por parte da Armada e Costa Martins e Galvão de Melo em representação da Força Aérea, todos eles exibindo nos ombros as estrelas de general.

MENSAGENS DIRIGIDAS AO POVO DE ANGOLA PELOS GENERAIS ANTÓNIO DE SPÍNOLA E COSTA GOMES.

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(fotos Notícia - Angola)

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Santos e Castro o último Governador de Angola.
(foto Notícia-Angola)

UM GOLPE CAÍDO DO CÉU

"O 25 de Abril surpreendeu tudo e todos em Angola. Luanda vivia a vida cosmopolita de uma capital colonial, e só uma meia dúzia de dias depois, em princípios de Maio, no Zaire e na Zâmbia, os movimentos de libertação reagem ao golpe militar em Portugal, com proclamações de continuação da luta até à independência total. Ironicamente, o golpe em Portugal haveria de conceder-lhes um protagonismo que estavam longe de ter conquistado.

José Gomes

As promessas de continuação da guerra com que o MPLA, a FNLA e a UNITA reagiram ao golpe em Portugal, diga-se em boa verdade, não tiravam o sono a ninguém.

Em 1974, a luta de libertação atravessava um período crítico: o Exército português controlava militarmente todo o território - as operações tinham cessado em 1972 e a livre circulação era um facto.

Após o surgimento, em meados dos anos 60, de actividade militar no interior - O MPLA abre em 66 a Frente Leste, a UNITA ataca Vila Teixeira de Sousa, na fronteira catanguesa, em fins de 65 -, os movimentos encontravam-se minados por profundas crises internas.

Neto mandara fuzilar, dois anos antes, vários comandantes no Leste, após a revolta dos Bundas, e o movimento está recuado na Zâmbia, envolvido num debate interno para a revitalização daquela frente. Chipenda proclamara no ano anterior a cisão, em protesto contra a assinatura, por Neto e Holden Roberto, do inesperado acordo para a criação do Conselho Supremo para a Libertação de Angola.

Mais tarde, já em 74, mas ainda antes do 25 de Abril, virá a surgir uma outra facção, a Revolta Activa, propondo amplo debate para a redefinição da estratégia da luta de libertação.
Pelo lado da FNLA, as coisas não estavam melhores. Apesar de se saber que o movimento, com apoio de Mobutu, estava a formar no Zaire um exército de 9.000 homens, treinado por instrutores chineses e bem armado, Holden Roberto estava precisado de quadros dirigentes. Mandara fuzilar, após a revolta de Kinkuzo, no Zaire, em princípios de 72, dezenas de oficiais do seu Estado-Maior, e vários outros haviam fugido para Brazzaville.

A UNITA encontra-se no interior, abaixo da linha do caminho-de-ferro de Benguela, sem actividade militar conhecida".

http://jn2.sapo.pt/secdiv/especial/angola1.htm

http://pissarro.home.sapo.pt/memorias14.htm


Ver:   Aida Viegas, Abandonar Angola. Um olhar à distância.

Governadores Gerais de Angola

Contornos da guerra em Angola: FACTOS mais RELEVANTES

MOSCOVO QUIS DAR A SAVIMBI A VICE-PRESIDÊNCIA DO MPLA

Angola: do 25 de Abril de 1974 a 11 de Novembro de 1975

Viagem Pela História de Angola

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Thanksgiving!

O Dia de Acção de GraçasPE ou Dia de Ação de GraçasPB (em inglês: Thanksgiving) é um feriado celebrado nos Estados Unidos e no Canadá, observado como um dia de gratidão, geralmente a Deus, pelos bons acontecimentos ocorridos durante o ano. Neste dia, pessoas dão as graças com festas e orações.

250px-Thanksgiving_Turkey O peru é considerado o principal prato do Dia de Acção de Graças.

TG Jantar típico de um dia de Acção de Graças.

Thanksgiving Dates 2008-2014

Thursday, November 27, 2008

Thursday, November 26, 2009

Thursday, November 25, 2010

Thursday, November 24, 2011

Thursday, November 22, 2012

Thursday, November 28, 2013

Thursday, November 27, 2014

Past Thanksgiving Dates:

Thursday, November 24, 2005

Thursday, November 23, 2006

Thursday, November 22, 2007

Ver: Thanksgiving

Dia de Acção de Graças

Thanksgiving at the White House - 2008

2008 Thanksgiving recipes from newspaper food sections

The News Tribune’s Northwest Thanksgiving 2008 recipes

terça-feira, 25 de novembro de 2008

O que fez a Região Militar do Norte no dia 25 de Novembro de 1975?

In "D'ali e D'aqui":

ANTÓNIO PIRES VELOSO
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Durante 30 anos, só se tem lido e ouvido que quem comandou o 25 de Novembro foi o herói Ramalho Eanes. Por amor de Deus, acabe-se de vez com esta mentira! Aliás, este militar, se fosse um homem de carácter e não "sofresse" de dupla personalidade, já teria vindo a público (teve inúmeras oportunidades para o fazer...), para denunciar esta mentira (que ele, em consciência, sabe que o é), e dizer aos portugueses que, de facto, quem comandou o 25 de Novembro foi o general Costa Gomes .
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A Região Militar do Norte (RMN), toda sob controlo, aguardava serenamente que alguma ordem lhe fosse dada, pelo verdadeiro comandante do 25 de Novembro, general Costa Gomes, para resolver qualquer problema no país, onde se tornasse necessário, em especial na região de Lisboa.
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A situação inicial no Sul estava de tal forma descontrolada que se temia fosse desencadeada, a partir dali, uma guerra civil no país. Entretanto, surgiu um misterioso grupo, auto-intitulado "Comando da Amadora" - onde se dizia estarem Tomé Pinto, Eanes, Monteiro Pereira e alguns outros -, que não conseguiu um mínimo de disciplina nas unidades que estariam na sua dependência.
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Na RMN foi-se trabalhando desde meados de Setembro no sentido de pôr ordem onde a desordem imperava, o que acontecia praticamente em toda a região. Porém, em 25 de Novembro, tudo estava já sob controlo. No quartel-general tinha sido encerrada uma das repartições (a 2.ª), que mais não era que uma "antena" da tristemente célebre 5.ª Divisão de Lisboa. Reactivada posteriormente, ficou a chefiá-la, por escolha, o coronel Azevedo Dias; tinham sido contactados muitos dos nossos melhores cérebros que, após o 25 de Abril, haviam fugido para o estrangeiro, no sentido de regressarem, pois o Comando da RMN - garantia a sua segurança; impediram-se as infelizmente habituais prisões sem culpa formada, correntes na época, contra todos aqueles que o PC apelidava de "fascistas" e "reaccionários"; tinha-se resolvido o difícil problema da "unidade Revolucionária de Chaves", ponta de lança do Partido Comunista; o problema do CICAP tinha sido resolvido. Foi mandado encerrar por mim (em Lisboa souberam pela comunicação social), tendo eu também informado os portugueses que as suas instalações iam ser destinadas aos ministérios da Educação e da Saúde. Assim se fez. Nisto tenho muito orgulho! A revolta do RASP foi dominada no momento oportuno. A unidade foi reocupada e disciplinada; tinha-se conseguido, com a colaboração dos partidos políticos democráticos, organizar uma gigantesca manifestação no Porto, de apoio ao primeiro-ministro, Pinheiro de Azevedo.
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Ninguém imagina a dificuldade que tive para chegar à fala com o primeiro-ministro! Os seus colaboradores mais próximos tudo fizeram para o impedir. A determinada altura, tive de perguntar ao comandante P. Neves, do gabinete, se queria que o comandante da RMN tivesse de se deslocar a Lisboa para trazer o almirante Pinheiro de Azevedo ao Porto! (O almirante disse-me depois que os seus colaboradores mais próximos tinham tentado, até à meia-noite da véspera da vinda, dissuadi-lo de aceitar a manifestação preparada no Porto.)
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Como é sabido, esta manifestação teve um impacto político positivo muito grande. O Comando da RMN tinha feito abortar a 3.ª manifestação SUV, se bem me lembro no dia 17 de Novembro; tinha-se procedido à montagem de um posto de rádio no meu gabinete, em colaboração com a Força Aérea, no sentido de se conseguir uma ligação directa e permanente com a Base de Cortegaça, onde se encontrava a maior parte dos aviões da nossa Força Aérea; foi dada a maior atenção às características do Norte de Portugal e das suas gentes, os seus sentimentos humanos, de generosidade, de solidariedade, ambicionando uma democracia verdadeira.
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A situação em Lisboa era de tal modo grave e insegura que, logo após o 25 de Novembro, alguém desse tal "Comando" me telefonou, a pedir que eu aceitasse "guardar" na minha região os militares que haviam sido presos (Tomé, A. Metelo, etc.), pois em Lisboa não havia segurança para o efeito. Eu disse que sim. E eles vieram. Entretanto, lá para baixo, a situação foi melhorando, desde que Vasco Lourenço havia assumido as funções de governador militar de Lisboa.
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Assim, é de espantar que Ramalho Eanes e os seus pares não tivessem conseguido um mínimo de disciplina nas unidades que deles dependiam! Naturalmente, o Regimento de Comandos era uma excepção, porque tinha à sua frente um militar, este sim, de grande valor: o coronel Jaime Neves, a quem o povo português muito ficou a dever. Lá, quem mandava era ele.
A minha surpresa foi grande ao ver desfilar na Avenida da Boavista, frente ao Hospital Militar do Porto, onde me encontrava em 1976, uma Força Militar do Regimento de Comandos, encabeçada e chefiada pelo coronel Jaime Neves.
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Transcrevo as palavras de Jaime Neves sobre este desfile (no livro O Norte e o 25 de Novembro, do jornalista Silva Tavares): "A iniciativa foi minha, que depois transmiti às companhias. O pessoal veio para o Norte, e já sabia ao que vinha. Fiz uma reunião de oficiais, onde manifestei a intenção de prestar homenagem ao nosso brigadeiro - foi ele que nos incentivou, foi ele que nos deu muito apoio naquelas horas decisivas... Eram para aí 1.200 homens, umas 70 ou 80 Chaimites, 123 jipes com canhão sem recuo, tudo impecavelmente alinhado... Eram umas 9, 9,30 da manhã, estava a chover... Foi só passar e fazer a continência...".
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Julgo também oportuno fazer realçar a actuação de Vasco Lourenço, notável desde o 25 de Abril, afrontando corajosamente em manifestações várias, comícios, plenários, insultos de toda a ordem, mostrando exemplar firmeza em todas as circunstâncias. Também nessa ocasião recebi um telefonema desse chamado "Comando da Amadora" (julgo ter sido Vítor Alves, não tenho a certeza), a pedir-me para eu enviar, com muita urgência, para Lisboa (pois "estamos muito aflitos"), três batalhões.
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Eu acedi, admitindo que o pedido tinha a concordância do general Costa Gomes, mas disse que iam seguir imediatamente, não três batalhões, mas três companhias, consideradas pelo povo de Lisboa como seus salvadores. Foram fortemente ovacionadas quando das suas deslocações pelas ruas da cidade. Este "Comando da Amadora" andou muitas vezes à deriva, ao sabor dos acontecimentos e dos conselhos de uns tantos políticos, sem tomar as decisões de fundo que se impunham, mas de que o tenente-coronel Ramalho Eanes e os outros oficiais não eram capazes.
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Ao falar no dia 21 de Novembro deste ano no Canal 2, o general Tomé Pinto, quando referiu a Força Aérea, esqueceu-se de dizer que tinha sido o general Lemos Ferreira que, no meu gabinete, durante uma noite inteira, comigo a seu lado, tentou desmobilizar os pára-quedistas que ocupavam indevidamente as bases, conversando com os responsáveis, "amolecendo-os". fazendo-lhes ver os erros que cometiam.
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No dia 25, de manhã, o general Lemos Ferreira fez a sua apresentação no comando da minha região militar, sem guia de marcha. Veio para o Porto depois de ter conversado com vários oficiais da Força Aérea, só não o fazendo com o chefe do Estado-Maior, general Morais e Silva, por impossibilidade de contacto com este. Recebi-o no meu gabinete mesmo sem guia de marcha, com um grande abraço, e disse-lhe: "Vamos trabalhar juntos." De imediato se fez o seguinte:
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1. Puseram-se no ar 40 aviões T-6, que sobre voaram as principais cidades do país.
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2. Em ligação com o tenente-coronel Ferreira da Cunha, na Presidência da República, cortou-se a emissão da RTP em Lisboa, transferindo-a para o Porto (não foi actuação do "Comando da Amadora", como o general Tomé Pinto quis fazer crer). O tenente-coronel Ferreira da Cunha era secretário de Estado da Comunicação Social e, com o Governo em greve, foi-se "implantar" no Palácio de Belém. A sua acção fez-se logo sentir.
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Foi ele que me telefonou para o meu Gabinete pedindo-me que eu neutralizasse, durante algumas horas, o responsável da Delegação do Norte do Ministério da Comunicação Social, que não oferecia confiança, a fim de que se efectuassem, os procedimentos técnicos, que levassem à mudança da emissão de Lisboa para o Porto. Outro exemplo da sua acção deve ser referido. Em determinado momento, o Almirante Rosa Coutinho, fazendo o jogo do inimigo, procurou lançar a confusão, ao tentar na Sala dos Telexes do Palácio Foz, divulgar uma notícia falsa (que os fuzileiros teriam ocupado a "Ponte 25 de Abril"). O Presidente da República chamou Ferreira da Cunha para dar satisfação à queixa de Rosa Coutinho que fazia a acusação de estar a haver "censura". Ferreira da Cunha, calmamente, disse-lhe que essa informação não era verdadeira, sugerindo que o general Costa Gomes, ele próprio, e o almirante se deslocassem ao local de helicóptero. A sugestão foi aceite. Quando lá chegaram, verificaram que não havia fuzileiros. A ponte não estava ocupada.
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É justo dizê-lo: o tenente-coronel Ferreira da Cunha é um homem superiormente inteligente, de grande carácter, humilde, inexcedível em patriotismo e espírito de missão, cuja acção junto do Presidente da República foi de importância capital. É um militar a quem o país também muito ficou a dever.
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3. Fizemos um comunicado, com a colaborarão do coronel Câmara, dizendo aos portugueses que a nossa Força Aérea estava com a RMN e com o Presidente da República.
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4. Quando, já tarde, se soube que uma multidão cercava o Quartel de Setúbal, já de noite se fizeram sair dois jactos T-37, desarmados, que picaram sobre os manifestantes, que num repente debandaram.
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5. A determinado momento, chamei ao quartel-general o comandante da Defesa Marítima do Norte, para saber qual a "cor" do seu pessoal, o seu estado de espírito, etc. O comandante mostrou-se confuso e ambíguo, tendo eu então terminado a conversa, dizendo-lhe: "Tenho muito que fazer, mas entenda-se ai com o sr. general Lemos Ferreira, que ele lhe dirá o que combinámos. Mas uma coisa é certa, os seus navios estão proibidos de sair do Porto."
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Dada a informação que havia, de que os fuzileiros do Vale do Zebro se preparavam para vir vara o Norte e atacar a Base de Cortegaça, foi necessário imobilizar os navios de guerra estacionados aqui na zona e actuar imediatamente: a) Combinei com Lemos Ferreira que os aviões de Cortegaça seriam carregados com bombas e afundariam os barcos dos fuzileiros que passassem o paralelo de Peniche; b) Foram mobilizadas traineiras, que se manteriam ao largo, para, através da rádio, nos informarem do perigo. Nesta acção teve papel relevante o bem conhecido e respeitado no meio piscatório Mestre Caravela; c) Informou-se o Comando Superior da marinha da possibilidade de os barcos dos fuzileiros serem afundados. E os fuzileiros não apareceram!
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Também não foi o "Comando da Amadora", ao saber-se deste possível ataque dos fuzileiros, quem teve qualquer intervenção. Nem sequer me avisaram dessa possível "invasão" do Norte! (Talvez não estivessem a par do problema...) O "Comando da Amadora", na realidade, foi um " bluff"!!! Passaram o tempo a fazer planos, segundo se depreende de afirmações recentes de oficiais desse "Comando" e, segundo Ramalho Eanes, estavam mais preocupados com a política do que com a parte militar. Para finalizar, deixo esta pergunta: passados todos este anos, por que é que nenhum dos oficiais deste propalado "Comando da Amadora" (hoje, todos ou quase todos os oficiais são generais), e mesmo políticos responsáveis, veio dizer aos portugueses que, se não fosse o patriotismo da gente que, se não fosse o patriotismo da gente do Norte, a sua coragem, a sua determinação e a dos militares aqui em serviço, o Partido Comunista não teria hesitado em assaltar o poder e a guerra civil teria sido inevitável!
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Quando, às 2h da manhã, o Presidente da República chamou a Belém Álvaro Cunhal, dizendo-lhe para desistir, pois o Norte estava coeso e com muita força, Cunhal cedeu. Sempre que se têm feito referências ao 25 de Novembro, nestes 30 anos, o Norte e a sua Região Militar têm sido sistemática e totalmente esquecidos, quer pelos responsáveis políticos, quer pelos generais nascidos no tal "Comando da Amadora".Porquê?
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Durante 30 anos, só se tem lido e ouvido que quem comandou o 25 de Novembro foi o herói Ramalho Eanes. Por amor de Deus, acabe-se de vez com esta mentira! Aliás, este militar, se fosse um homem de carácter e não "sofresse" de dupla personalidade, já teria vindo a público (teve inúmeras oportunidades para o fazer...), para denunciar esta mentira (que ele, em consciência, sabe que o é), e dizer aos portugueses que, de facto, quem comandou o 25 de Novembro foi o general Costa Gomes. Não permitir que, na nossa História, se minta às actuais e futuras gerações são os meus votos.

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■ GENERAL NA REFORMA

Pires Veloso lança memórias sobre o 25 de Novembro de 75 em livro

In "RTP Noticias":

No dia em que se completam 33 anos depois do 25 de Novembro de 1975, Pires Veloso lança um livro de memórias sobre a época em que Portugal esteve à beira de uma guerra civil. O antigo general afirma à Antena 1 que o objectivo de "Vice-rei do Norte - memórias e revelações" é repor a verdade. Uma reportagem do jornalista Pedro Sá Guerra.

O livro está cheio de novidades sobre os “anos quentes” de 1974-77.

"Costa Gomes e Cunhal evitaram guerra civil em Portugal em 1975"

In "DN Online":

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Entrevista Pires Veloso. autor do livro 'Vice-Rei do Norte'


Porquê só agora estas memórias?


A verdade é filha do tempo.


Essa verdade não podia ter sido revelada mais cedo?


Quer há dois anos quer no ano passado, os meus amigos do Porto ofereceram-me um grande jantar por esta altura e insistiram comigo para que eu falasse sobre o 25 de Novembro [de 1975]. Chegou a altura.

Foi comandante da Região Militar do Norte (RMN) em 1975 e teve um papel fundamental na contenção do PREC [Processo Revolucionário em Curso]. Chamaram-lhe na altura "Vice-Rei do Norte". O 25 de Novembro valeu a pena?


O 25 de Novembro era necessário para repor os ideais do 25 de Abril. Quando assumi o comando da RMN, a indisciplina era total. O general [Carlos] Fabião [chefe do Estado- -Maior do Exército em 1975] disse- -me: "Não sei se conseguirá entrar no quartel-general [do Porto], as pessoas não deixam." Respondi-lhe: "Se os portões estiverem fechados, aterro de helicóptero na parada." Mas não foi preciso.


O PCP tinha influência no quartel-general da RMN?


A influência do PCP era tal que Ângelo Veloso, o chefe comunista do Norte, tinha um cartão de livre-trânsito, emitido pelo Corvacho [anterior comandante, conotado com o PCP], para entrar e sair do quartel, de noite ou de dia, quando entendesse.


Como caracteriza a instituição militar dessa época?


Assistia-se ao esboroar das Forças Armadas. Era horrível. O País esteve à beira da guerra civil. Na noite de 25 de Novembro, centenas de membros do PCP estiveram em vários pontos de Lisboa à espera de armas. Não chegaram a recebê-las porque o Álvaro Cunhal mandou desmobilizá- -los após uma conversa com o presidente da República Costa Gomes. Ele avisou-o de que iria perder, até porque eu tinha dois mil homens disciplinados, prontos a intervir. A Força Aérea estava contra o PCP. E o Regimento de Comandos, de Jaime Neves, também.


Mas a Marinha era de esquerda.


Na altura, correu o rumor de que os marinheiros de Vale de Zebro iam "conquistar o Norte". Chamei o comandante da Marinha e disse-lhe: "Diga lá aos seus patrões que se os marinheiros passam o Paralelo de Peniche são afundados pelas bombas da nossa aviação."


Estava a fazer bluff?


Não. Se viessem, eram afundados.


Tinha confiança nos seus dois mil militares?


Total. Mas quando cheguei ao comando só 150 me obedeciam.


Como conseguiu dar a volta?


Foi fácil: ser humano, ser tolerante. Sem esquecer a base de actuação: respeitar a vontade da maioria da população do Norte.


Ainda não tinha havido eleições. Como aferia essa vontade?


Falava com as pessoas. Não tinha dúvidas. Por isso me deram o cognome de "Vice-Rei do Norte".


Com que militares estavam em articulação, ao nível do comando?


Com o Jaime Neves - falávamos quase todos os dias. Com o presidente. E vários outros: Loureiro dos Santos, Firmino Miguel, Vasco Lourenço... Com o comando onde estavam o Eanes, o Tomé Pinto e o Garcia dos Santos praticamente nunca falei. Isso foi tudo prefabricado para fazer do Eanes um herói, que até já vem nos livros escolares. Ele não fez nada!


Então quem foi o cérebro do contragolpe?


O Costa Gomes.


Mas era um homem hesitante...


Era. Fazia um jogo. Mas esse jogo era inteligente. Conseguiu evitar a guerra civil. Ele e o Cunhal, ao perceber que os meus homens e o Regimento de Comandos davam cabo deles.


Como conseguiu calar o major Durand Clemente [porta-voz dos golpistas de extrema-esquerda] na noite de 25 de Novembro?


Dei ordens para que fossem desligados os emissores da Lousã e transferida a emissão da RTP para o Porto. A determinada altura, perguntaram- -me: "O que havemos de pôr na televisão?" Respondi: "Fados e guitarradas, e música popular."


Era como se fosse o director de programas...


Era o "Vice-Rei do Norte"! Meteu-se um bocado de ordem naquilo.


O que sente quando lhe chamam "Vice-Rei" ainda hoje?


Sinto orgulho.


É como uma condecoração?


É uma condecoração maior do que essas que costumam dar por aí a toda a gente.


Costuma votar?


Sempre.


Vota sempre para o mesmo lado?


Vou mudando. Entre o PSD e o PS.


Os militares são bem tratados?


Não. Os militares andam a ser tratados com muito desprezo, como se não prestassem. Isto gera mal-estar. Estão a mexer num vespeiro.

O 25 de Novembro - por Álvaro Cunhal

In "resistir.info":

1- O golpe militar em preparação
2- A tese do «contra-golpe»
3- O «cerco» de S. Bento
4- O «contra-golpe» falhado
5- A saída da crise político-militar

25 de Novembro - O papão do totalitarismo

In "EXPRESSO":

Os mitos em torno do 25 de Novembro de 1975. Confronto entre ditadura e democracia ou esboroar de uma revolução romântica, à ‘Couraçado Potemkine’, como escreveu, na altura, «Le Monde»?

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ARQUIVO EXPRESSO

O 25 de Novembro de 1975 foi reduzido por quase todos os comentadores ao confronto entre democracia ocidental e totalitarismo soviético. Duas semanas antes, Mário Soares e Álvaro Cunhal tinham protagonizado o famoso debate na RTP do «Olhe que não, doutor...». Henry Kissinger, secretário de Estado de Nixon, tinha visto em Soares e em Cunhal émulos de Kerenski e de Lenine e previsto para Portugal o mesmo desfecho de 1917, na Rússia. Mas era, de facto, isso que estava em causa?

Entre 1974 e 1975 viveu-se um dos períodos mais ricos e agitados da História portuguesa recente. Um regime que parecia eterno caiu num só dia. Sem censura, sem polícia política e sem guerra colonial, o mundo parecia ao alcance da mão. Havia que experimentar tudo o que durante 48 anos fora banido, da Coca-Cola ao Último Tango em Paris, do nudismo à autogestão. Na rua, as coisas avançavam mil vezes mais depressa do que na esfera institucional. Ter um Parlamento eleito e uma Constituição em andamento era bom, mas sabia a pouco. Como dizia, na época, uma canção de Sérgio Godinho: «Só quer a vida cheia quem teve a vida parada» e «A sede de uma espera só se estanca na torrente».

Explodiu uma constelação de experiências, das cooperativas de produção e distribuição às fábricas abandonadas pelos patrões ou pelas multinacionais e geridas por quem lá trabalhava. Num bairro construído longe de tudo, nos arredores do Cacém - Mira Sintra -, os moradores foram criando creches, farmácias e jardins onde nada havia. Alguns dos melhores arquitectos projectaram os bairros das operações SAAL e das cooperativas de habitação.


F2-U0601

ARQUIVO EXPRESSO

Cercado no Quartel do Carmo, a 25 de Abril de 1974, Marcello Caetano chamara Spínola «para o poder não cair na rua». Uma parte já tinha caído. E o resto do poder depressa se tornou multipolar. Um ano depois, os partidos não se entendiam. O Presidente da República, não eleito, era um pólo de conspiração. Estava assinado um pacto entre o Movimento das Forças Armadas e os partidos. O Conselho da Revolução tutelava a produção legislativa. Nos círculos militares vivia-se um delicado equilíbrio. A Igreja virava à direita e amotinava o campo contra o comunismo. Até porque a hiperpolitizada vida de Lisboa aparecia como um universo estranho às populações rurais, cujo quotidiano pouco mudara com o 25 de Abril.

Proliferavam braços armados, da extrema-esquerda à extrema-direita. A polícia não funcionava, substituída pelos militares do COPCON, que, frequentemente, tomavam partido nas ocupações de casas, fábricas ou terras. No final do Verão Quente de 1975, os sectores básicos da economia estavam nacionalizados. Lisboa tinha, semana sim, semana não, grandes manifestações de moradores, trabalhadores, estudantes e soldados, às quais delegações da extrema-esquerda europeia davam um toque cosmopolita. No Norte havia bombas e arruaças contra as sedes do PCP e partidos mais à esquerda. Lá se dizia que Portugal só começava de Rio Maior para norte e que para baixo «era Moscovo».

Entretanto, o antagonismo entre a extrema-esquerda e o PCP era insanável. Mais que uma vez, o serviço de ordem comunista interveio, de forma musculada, contra movimentos de trabalhadores ou de estudantes que não conseguia controlar. Já Mário Soares tinha a apoiá-lo na famosa manifestação da Fonte Luminosa radicais da extrema-direita com quem não se sentaria à mesa. Os diversos poderes político-militares viviam um equilíbrio instável que não iria durar sempre. E a tentação totalitária não estava só do lado da esquerda. O revanchismo dos derrotados do 25 de Abril sonhava com um Pinochet português e o Estádio da Luz cheio de «comunas» para fuzilar...

Ao fim do dia 25 de Novembro de 1975, quando as forças afectas ao VI Governo Provisório neutralizaram as unidades militares contestatárias, houve choro e ranger de dentes dos dois lados. Mais à esquerda acusava-se o PCP de traição por não ter apoiado a resistência nas ruas. No extremo oposto do espectro amaldiçoava-se o major Melo Antunes quando este apareceu na TV a vincar que o PCP era indispensável à construção da democracia.

A 30 de Novembro, escrevia-se em «Le Monde»: «A revolução romântica, à ‘Couraçado Potemkine’, que há um ano incomodava a Europa e inquietava Washington, dissipou-se em 48 horas como uma nuvem de fumo. Alguma vez teria sido outra coisa?»

Ironicamente, em 1980, em novo período agitado, marcado pela bipolarização e pela morte de Sá Carneiro a dois dias das eleições presidenciais, seria Eanes, o vencedor militar do 25 de Novembro, em tempos amaldiçoado pelos sectores à esquerda do PS, a travar nas urnas a viragem à direita que teria representado a eleição de Soares Carneiro. Malhas que a História tece...

TEXTO DE RUI CARDOSO


Era uma vez dois filmes e uma cooperativa

F1-U0621

DOIS FILMES e uma história real documentam a atmosfera turbulenta de 1974/75.

A Confederação, de Luís Galvão Teles (com música de Sérgio Godinho, Fausto e José Mário Branco), foi rodado em 1974/75, mas só exibido em 1978. Um Portugal futuro, perdido entre os espectros do salazarismo e as saudades de uma revolução que não chegou a ser, evocado por imagens a preto e branco. E que degenera numa confederação de dois Estados totalitários, Norte e Sul, de sinal político contrário. No fim, os dois protagonistas (Margarida Carpinteiro e Carlos Cabral) são encurralados por soldados fardados, uns de negro e outros de branco, que lhes perguntam: «Norte ou Sul?» Independentemente da resposta, são fuzilados. Surge, então, a preto e branco, um soldado que diz estarmos a tempo de evitar aquele futuro. E remata, erguendo a G3 acima da cabeça: «O Povo é que faz a História!» É interpretado pelo poeta popular da Lousã Jorge Cortez. «A ideia surgiu-nos antes do 25 de Abril, e a tónica era antifascista. À medida que as coisas foram evoluindo, o Amadeu Lopes Sabino e eu fomos reescrevendo o argumento», resultando, segundo o realizador, «uma ficção científico-política que ganhou alguma intemporalidade».

Bom Povo Português, de Rui Simões (1980), é um documentário cujo olhar é o dos vencidos do 25 de Novembro. Inclui momentos-chave, desde o hastear da bandeira angolana até ao silenciar do capitão Duran Clemente, na RTP, a 25 de Novembro. Ou um Otelo solitário vendo na TV a tomada de posse de Eanes. A voz «off», de José Mário Branco, ironiza sobre a revolução, como quando intercala uma sucessão de «pás» no comentário ao 11 de Março e às nacionalizações. Rui Simões realça que, ao contrário da ficção, o documentário nunca é esquecido por aqueles que põe em causa. «Paguei vários anos de exílio interno por isso até conseguir voltar a filmar». Para acabar o filme teve de comprar imagens à RTP por interposto Thomas Harlan, pois de outra forma eram-lhe recusadas.

O caso da cooperativa Comunal é singular. Nasceu não de uma ocupação de terras mas do seu contrário: a junção voluntária de parcelas para ganhar viabilidade, surgindo uma queijaria, uma carpintaria e uma loja. A produção era vendida às cadeias de supermercados de Lisboa. «Era um projecto de revitalização do mundo rural, semelhante aos que hoje se poderiam fazer com fundos da União Europeia», explica o arquitecto Pedro Lobo Antunes, um dos mentores da Comunal. O coração da cooperativa era Árgea, «uma aldeia especial, com tradição republicana e associativa». Ainda hoje lá está a antiga loja da Comunal, agora um supermercado. Quando foram pedir apoios financeiros, os cooperativistas foram postos pelo Ministério da Agricultura numa situação surrealista: só havia subsídio se houvesse ocupação de terras... A 25 de Novembro, a aldeia foi cercada pelo Exército, à procura de armas. «A única coisa militar que encontraram foram uns colchões, mas nem isso o povo da aldeia os deixou levar», conta Lobo Antunes, agora vereador da Câmara pelo PS, já no segundo mandato. Com o 25 de Novembro, os apoios desapareceram, e a cooperativa foi-se desagregando. (Sobre este tema retenham-se, ainda, os documentários Torrebela, de Thomas Harlan, exibido há dois anos, Outro País, de Sérgio Treffaut, 1998, e o recente As Operações SAAL, de João Dias).

Vários caminhos vão dar a Roma

In "EXPRESSO assinantes":

O 25 de Abril aconteceu num momento ímpar ou, pelo contrário, já tinham ocorrido momentos históricos em que a queda do regime instaurado por Salazar seria mais previsível? O facto de a democracia em Portugal não ter sido negociada, mas resultante de uma ruptura, foi positivo ou negativo para o desenvolvimento do processo político? Qual o peso da Europa e dos Estados Unidos no apoio à luta das forças democráticas durante o PREC? Como se formou a nossa identidade europeia? Questões sobre a mais complexa e precursora das transições democráticas

f1-r1041-hcs Tropas apoiantes do movimento dos capitães, no Terreiro do Paço, no dia da revolução de 25 de Abril

1 - A FRASE é banal: o 25 de Abril abriu a terceira vaga dos processos de democratização. Numa perspectiva comparada, no entanto, ela apresentou singularidades marcantes, a começar pelos actores políticos que desencadearam o fim da ditadura de Marcello Caetano. Ainda sem grandes constrangimentos internacionais pró-democratizadores e em plena «Guerra Fria», a ruptura provocada pelos militares deu lugar a uma crise acentuada do Estado, potenciada pela simultaneidade entre democratização e descolonização.

A transição portuguesa foi a mais complexa da Europa do Sul nos anos 70. Se pedirmos emprestado ao politólogo italiano Leonardo Morlino uma definição de transição, como «o período fluido e incerto em que as estruturas democráticas estão e emergir», mas onde ainda não é claro que regime vai ser instaurado, a sua fase mais complexa decorre entre 1974 e 1976, com a aprovação da Constituição e as eleições legislativas e presidenciais. Concentraram-se nestes 2 anos tensões poderosas na sociedade portuguesa, com alguns elementos de uma conjuntura revolucionária.

f2-r1041-hbs Humberto Delgado com o líder comunista Álvaro Cunhal. A candidatura à presidência do «general sem medo» foi, historicamente, uma oportunidade perdida de derrubar o regime fascista português

2 - A RESPOSTA ao problema da queda da ditaduras é de grande dificuldade. Os historiadores mais simplistas responderão facilmente no caso português. Verão movimentos sociais radicalizando-se no marcelismo, dirão que foi o movimento de crescimento económico dos anos 60, com as suas novas classes médias a demarcarem-se do regime, enquanto outros irão ensaiar hipóteses conspirativas mais viradas para a «longa duração», vendo nos militares, por exemplo, uma vocação democratizante delineada desde os anos 50. No entanto, estes elementos de explicação estão longe de ser claros e em várias ocasiões a queda da ditadura seria mais previsível: na sequência da derrota do fascismo, em 1945; com o movimento de desafeição expresso na campanha eleitoral do general Humberto Delgado; na conjuntura do início da guerra colonial e do golpe de Estado do General Botelho Moniz; para dar apenas 3 exemplos.

Em boa verdade, a grande singularidade do caso português foi precisamente a intervenção democratizante do movimento dos capitães, rara senão única neste século, e que estava longe de ser previsível, muito embora a guerra colonial os tivesse tornado actores centrais de qualquer mudança política.

f3-r1041-hbs Humberto Delgado com Mário Soares

Apesar do efeito surpresa, a intervenção militar deu-se num contexto ditatorial onde existiam elites alternativas que tinham laços sólidos com alguns segmentos da sociedade civil. A presença de uma oposição semi-legal e clandestina diversificada ao Salazarismo, e a emergência da «Ala Liberal» dissidente do marcelismo, muito embora com escassa ligação ao militares que desencadearam o golpe de estado, foi fundamental, pois constitui de imediato uma opção legitimada pelo combate à Ditadura.

3 - AO CONTRÁRIO de Espanha, Portugal conheceu uma transição por ruptura, ou seja sem qualquer pacto ou negociação entre a elite da ditadura e as oposições, mas não existe uma relação directa entre esta acentuada descontinuidade e a radicalização subsequente.

Muito embora uma mobilização anti-ditatorial diversificada tenha sido determinante nos primeiros dias após o 25 de Abril, nomeadamente na imediata dissolução das instituições mais conotadas com o Estado Novo, como a PIDE ou o partido único, e nas ocupações de muito sindicatos, organismos corporativos e Câmaras Municipais, a verdade é que o I Governo provisório bem como uma parte das elites militar e das organizações de interesses apontavam para uma imediata institucionalização de um regime democrático, baseado na convocação rápida de eleições. A própria dinâmica da formação e legalização dos partidos políticos era disso símbolo.

f4-r1041-hbs No próprio dia 25 de Abril, os militares revoltosos ocuparam a sede da PIDE/DGS - a polícia secreta fascista - na Rua António Maria Cardoso. E prenderam, nas ruas, numerosos agentes

A clivagem em torno da descolonização, motor inicial do conflito entre muitos dos obreiros do golpe e o general Spínola, marcou a emergência política do MFA. Reside aqui, creio, a abertura de um espaço de mobilização política e social e a concomitante crise do Estado que pode explicar a incapacidade de as elites moderadas dominarem «por cima» a rápida institucionalização da democracia representativa. Muitos analistas da transição portuguesa salientaram justamente esta «revitalização da sociedade civil», como factor de radicalização, mas convém sublinhar que esta se desenvolve em paralelo com a predominância do chapéu protector de parte do MFA e é dificilmente imaginável sem ele.

Os tímidos movimentos de ruptura simbólica e de elites com o passado começaram então a desenvolver-se. O rápido e multidireccionado movimento de «saneamentos» foi disso exemplo. Após uma decisão de afastamento da elite política da ditadura e de alguns militares, este movimento de «desfascização» começou a envolver a administração pública e o sector privado e caracterizou-se pela sua progressiva radicalidade, atingindo quadros muito abaixo da elite política mais visível do regime deposto, ainda que de forma muito desigual. As reivindicações de criminalização política da PIDE e de outros organismos repressivos também cresceu.

f5-r1041-hbs Ao longo do processo de independência das antigas colónias ultramarinas, cerca de 500 mil pessoas regressaram a Portugal. A chegada dos «retornados» - como passaram a ser chamados - criou um dos mais graves problemas sociais que o país teve de enfrentar no rescaldo da revolução

Foi também sob esta pressão que os partidos que iriam representar a direita e o centro direita se formaram. Após a ilegalização de várias formações, com o 28 de Setembro e o 11 de Março, o CDS, responsável pela integração no sistema democrático de segmentos mais autoritários da sociedade portuguesa, iria estar na fronteira da ilegalização até às primeiras eleições, em 25 de Abril de 1975.

4 - A QUEDA de Spínola, a aceleração da descolonização, a reforma agrária e as nacionalizações, são símbolos e motores de uma acentuada crise do Estado que alimentaram poderosos movimentos sociais. A decisão do MFA de respeitar o calendário eleitoral foi o elemento central da abertura de uma legitimidade fundadora do regime democrático, e a sua realização em 25 de Abril de 1975 dotou os partidos moderados de uma alavanca poderosa.

Seria simplista considerar o «Verão quente» de 1975 apenas como a tentativa do PCP impor uma ditadura apoiada pela União Soviética. Muito embora seja natural que a elite política democrática tenha concentrado aqui o fundamental do seu discurso fundador, ele está longe de esgotar o tema. O desenvolvimento de fortes estruturas políticas de base, como as comissões de trabalhadores, o desafio que a extrema-esquerda representou nesta conjuntura de crise, e a própria penetração política desta nas Forças Armadas são exemplos de uma maior complexidade que passou pelos casos da emissora católica - Rádio Renascença - e do jornal «República», ou pela dinâmica de ocupação de propriedade urbana em Lisboa. As clivagens políticas no interior das Forças Armadas também introduziram alguma autonomia que não pode ser reconvertida em mera «conspiração programada».

f6-r1041-hbs No período pós-revolucionário, as manifestações de rua sucediam-se um pouco por todo o país. Nas grandes cidades, como Lisboa, movimentos populares reivindicavam a legitimidade da ocupação de prédios e habitações devolutos

Portugal conheceu então uma conjuntura de polarização rara neste século, sobretudo pela mobilização anti-revolucionária da província. Muito embora protagonizada pelo PS e PSD em Lisboa e no Porto, à medida que o sector moderado do MFA se preparava para o 25 de Novembro, a mobilização de província a norte do Tejo só é possível com a entrada em cena da hierarquia da Igreja Católica e a mobilização paroquial, em conjunção com a notabilidade conservadora local. Acompanhada pela mobilização de elementos de direita e extrema-direita, militares e civis, a ofensiva anti-esquerdista passou por uma onda de violência política contra as sedes do PCP e da extrema-esquerda, bem como pela emergência de líderes populistas associados às elites rurais.

5 - PORTUGAL sofreu, durante o curto período de 1974-75, uma significativa intervenção externa, não só diplomática como também na própria estruturação dos partidos políticos, organizações da sociedade civil (como sindicatos e organizações de interesse) e na estratégia anti-esquerdista do «Verão quente» de 1975. Por outro lado, o caso português foi tema divergente nos fora internacionais, da NATO à CEE, passando pelas relações entre estas instituições e o então bloco socialista, dirigido pela União Soviética. Quaisquer que sejam os indicadores escolhidos, parece não oferecer dúvidas que o período de 1974-75 em Portugal conheceu grande saliência internacional.

f7-r1041-hbs Em Outubro de 1974, a «ponte Salazar» - a grande obra do Estado Novo que ligou Lisboa a Almada - foi «limpa» das referências ao antigo regime, passando a chamar-se «Ponte 25 de Abril». Uma alteração própria do processo de «desfascização», característico do período pós-revolucionário

Apanhada de surpresa pelo golpe, a comunidade internacional, como particular relevo para os EUA, concentrou-se no apoio às forças políticas democráticas de centro-esquerda e de direita, na metrópole, e no acompanhamento e intervenção no rápido processo de descolonização, particularmente em Angola. Utilizaram-se então métodos herdados do após guerra, particularmente em Itália. Perante uma fortíssima mobilização política e social esquerdista, um tecido económico com um forte sector nacionalizado e a fuga generalizada de capitais e da própria elite económica, os partidos moderados só conseguiram um mínimo de implantação e funcionamento nesta conjuntura de crise com um apoio financeiro e de formação de quadros significativo por parte da administração norte-americana e das organizações internacionais das famílias políticas europeias, com as segundas servindo por vezes de mediadoras do apoio da primeira.

Utilizando um modelo que fará escola noutros processos de transição na América Latina e na Europa de Leste, as fundações associadas às internacionais socialista, liberal e democrata-cristã foram importantes no desenvolvimento das máquinas partidárias e do movimento sindical anticomunista. A mobilização contra a unicidade sindical, a criação da UGT e de algumas associações de agricultores foram fenómenos particularmente marcados por esta dinâmica.

f8-r1041-hbs 11 de Março de 1975: forças militares afectas ao general António de Spínola tentaram mudar o curso da revolução. Um avião da Força Aérea sobrevoou Lisboa e chegou a disparar contra o quartel do Ralis - ataque durante o qual morreu um soldado daquela unidade

Mesmo no caso das movimentações sociais anticomunistas no centro e norte do país, muito embora aqui com peso central de instituições como a Igreja Católica, algum apoio logístico e estratégico foi também marcante, ainda que a torneira aberta aos seus segmentos mais radicais, do MDLP e do ELP tenha sido rapidamente fechada a seguir ao 25 de Novembro de 1975. E aqui, o tecido empresarial nortenho e os serviços de segurança espanhóis foram, eventualmente, mais importantes.

6 - A INTERVENÇÃO militar de 25 de Novembro marcou o passo do processo de consolidação da democracia, com as eleições legislativas e presidenciais de 1976. Muito embora com heranças importantes da transição inscritas na Constituição e uma presença militar no sistema político que se arrastará até princípios dos anos 80, deram-se neste período os passos fundamentais da consolidação da democracia.

A opção europeísta do segmento maioritário das elites políticas portuguesas foi um produto da transição para a democracia e foi um elemento central da sua consolidação. O caso português ilustra bem a tese segundo a qual a Comunidade Europeia, enquanto referência da Europa desenvolvida, foi um símbolo disponível para as elites democráticas legitimarem uma nova ordem interna, após uma transição por ruptura bastante conflitual e o fim do império colonial, que tinha sido o argumento final do Estado Novo.

f9-r1041-hbs Salgueiro Maia, um dos mais destacados capitães de Abril, no dia 25 de Novembro de 1975, quando tropas da Escola Prática de Cavalaria de Santarém fizeram uma paragem na estrada do Norte, a caminho de Lisboa

Foi fundamentalmente no contexto das clivagens políticas de 1975 que os partidos políticos de direita e de centro-esquerda reforçaram a constelação europeia e comunitária como referência para Portugal, perante alternativas socialistas e terceiro-mundistas. No contexto de uma transição polarizada em 1974-75, a opção europeísta foi um elemento central de ruptura com o passado ditatorial, isolacionista e colonial, assumindo simultaneamente um dimensão inicial anticomunista e anti-revolucionária.

Enquanto actor internacional, a CEE foi um observador discreto da transição portuguesa, não deixando de dar sinais políticos a favor de uma democracia pluralista ao mesmo tempo que fornecia algum apoio económico. Seria, no entanto, precipitado considerar a CEE, enquanto actor internacional, um elemento determinante na consolidação da democracia em Portugal. Muito embora vários estudiosos tenham sugerido que a Comunidade Europeia teve um papel importante na promoção da democracia na Europa do Sul, a sua verificação para Portugal foi menos nítida. Para uma parte da elite política portuguesa da época, no entanto, a adesão era vista como uma garantia de consolidação democrática interna e como uma alavanca para a modernização do país.

f10-r1041-hbs Mário Soares na cerimónia de assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia - um momento que marca uma fase de consolidação da democracia portuguesa

7 - AO LONGO dos anos 80, a sociedade portuguesa afastou-se da dupla herança do período autoritário e do processo revolucionário de 1975. Consolidação democrática, adesão à CEE e desenvolvimento económico coincidiram parcialmente no tempo, num círculo virtuoso dificilmente previsível aquando do pedido de adesão.

Em 1990, para surpresa de vários sectores da opinião pública, Portugal abandonou o campo dos países subdesenvolvidos onde tinha estado desde que o conceito fora inventado. Depois de dois acordos complexos com o Fundo Monetário Internacional, chegou a Portugal um fluxo de fundos comunitários de apoio e os seus efeitos começaram a ser sentidos, com as estatísticas a reflectirem uma melhoria visível nas condições de vida, com um desemprego relativamente pequeno. Nos anos 80, Portugal assistiu a um segundo ciclo de crescimento e mudança social. Acentua-se a litoralização da população e a urbanização deu um novo salto, muito embora Portugal permaneça ainda abaixo da média europeia. Mais importante, a quebra da população activa na agricultura foi muito significativa. Sintoma da desagregação da sociedade rural tradicional, ainda dominante no final dos anos 70, na província do Centro e Norte do país, que em vez de emigrar, se dirigiu agora para os centros urbanos nacionais. Acentuou-se também a terciarização e o crescimento das classes médias, com a taxa de escolarização a aumentar significativamente neste período.

f11-r1041-hbs António Guterres na tradicional «fotografia de família» no final da Cimeira Europeia de Berlim

Contrariando as perspectivas mais catastrofistas dos anos 70, Portugal consolidou a sua democracia e deu um salto importante na modernização económica e social, já como membro da União Europeia, vendo-se mesmo obrigado a acelerar a liberalização do seu mercado interno como consequência do aprofundamento da União Económica e Monetária, entretanto acordada. Reafirmando a sua identidade europeia, mantendo-se optimistas sobre a União Europeia e a integração portuguesa ao longo dos anos 80, os portugueses, tanto quando os estudos de opinião publica permitem avaliar, não passaram por sérios problemas de identidade com o fim do império colonial, em 1975, e a sua nova inserção internacional no espaço europeu, em 1986.

Texto de ANTÓNIO COSTA PINTO

Professor de História Contemporânea do ISCTE, autor de O Salazarismo e o Fascismo Europeu (Lisboa, 1992) e Modern Portugal (Palo Alto, EUA, 1998)

 
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